Homilia do
Reverendo Senhor Bispo D. João Lavrador
Reúne-nos,
hoje, na Catedral a celebração da sua dedicação e com ela o inicio de um novo
ano pastoral. Fazemo-lo em comunhão eclesial, à volta do nosso Bispo, que
embora ausente em trabalhos pastorais da Conferência Episcopal, queremos
lembrá-lo e em acção de graças aos Senhor, rogar por ele e pelo seu ministério
na nossa Igreja diocesana.
Mas a nossa celebração toma a expressão também do
compromisso daqueles que, vivendo na unidade e na comunhão da Igreja, se
dispõem a servi-la através da evangelização nos diversos âmbitos em que ela se
empenha na única missão de Jesus Cristo.
Por isso, entre muitos cristãos empenhados na vida da
Igreja diocesana, estão aqui os Vigários da Vara das diversas Vigararias, os
membros dos secretariados diocesanos com os seus responsáveis, os professores
de Educação Moral e Religiosa nas Escolas e institutos de vida consagrada.
A Palavra de Deus que acabámos de escutar coloca o ser
humano com as suas inumeráveis carências perante Deus que vem ao seu encontro
com a Palavra e com os sinais salvíficos.
A marca que o profeta Isaias nos quer deixar, como
deixou aos seus contemporâneos, é de coragem pela retribuição e pela justiça
que Deus vem trazer. Então, o profeta a partir das limitações humanas,
descritas pela falta de vista, do ouvido, do andar e do falar, ou através da
imagem do deserto, convida a reconhecer que a presença e a actuação de Deus
oferecem ao ser humano a sua dignidade original, proporcionam-lhe a vivência da
esperança e da alegria e, no contexto em que vive tudo será modificado de tal
modo que a vida se exprime por tal exuberância que se pode comparar às águas
correntes que tomam o lugar do deserto, ou as nascentes que substituem a terra
sequiosa.
Mas a experiência de proximidade e de actuação
concreta e sensível de Deus só se faz em Jesus Cristo. Por isso, o Evangelho
apresenta-nos a cena do encontro entre um surdo que falava com dificuldade e o
próprio Senhor.
Neste homem carenciado destes dois sentidos
importantíssimos para a sua compreensão, para a sua relação com os outros e com
o meio onde vive, está representada toda a humanidade que enquanto não se
encontrar com Jesus Cristo através da Sua Palavra e pelos gestos salvíficos,
não se reencontra com a sua dignidade de filha de Deus.
O centro desta cena conduz-nos à acção de Jesus Cristo
que se realiza permanentemente na Igreja.
O modo como Jesus acolhe e como executa a obra que transforma
o ser deste homem conduz-nos à profundidade de vida divina que os sacramentos
oferecem a partir dos sinais exteriores.
S. Tiago presenteia-nos com o contexto no qual a
comunidade cristã deve viver o verdadeiro amor de Deus pelo ser humano.
Se preferência deve haver entre os discípulos de Jesus
Cristo só poderá ser para com os mais pobres e marginalizados.
Por isso, a segunda leitura começa por uma forte
advertência que proferida pelo Apóstolo às suas comunidades é um alerta
constante para a sintonia de vida dos cristãos com o amor que Deus oferece aos
seus filhos, convidando-os à partilha fraterna e ao serviço dedicado aos que
mais precisam.
Voltando-nos novamente para o Evangelho, encontramos
três expressões que nos comprometem na acção evangelizadora e no serviço a
prestar à pessoa e à sociedade.
Começa por dizer que aquele homem que tinha
necessidade dos gestos salvadores de Jesus Cristo foi conduzido por alguém.
Eis, o desafio evangélico tantas vezes sublinhado na
acção dos contemporâneos de Jesus Cristo, isto é, só é possível às mulheres e
homens de cada tempo encontrarem-se com a fonte da salvação que é Jesus Cristo
presente na comunidade cristã se houver quem vá ao seu encontro, os acolha e
conscientemente os encaminhe para Aquele que tem poder de libertar.
Não reconheceremos nós que está aqui uma exigência
actual para a nova evangelização?
Em segundo lugar aparece o próprio que recebeu a graça
salvífica e se reconhece na total dignidade de filho de Deus, que, apesar da
recomendação de Jesus Cristo em contrário, anuncia desassombradamente o nome
d’Aquele que o libertou.
É, sem dúvida, tão importante no processo
evangelizador a narração do que o Senhor vai realizando em cada um de nós.
A isto chamamos testemunho vivo e coerente, o
Evangelho a passar pela vida, pelos critérios, opções e valores que orientam a
existência de cada cristão e que se expõem a todos os que vivendo connosco são
chamados a reconhecer a Jesus Cristo como Aquele que oferece a plenitude da
vida e da realização.
Eis um segundo desafio para nós chamados a operar uma
nova evangelização com novo ardor, com novos métodos e com nova linguagem.
Por último, somos integrados e interpelados pelo
assombro da multidão que presenciava estes factos.
Sim, no modo como vivemos a fé cristã, como a
testemunhamos, da alegria que ela provoca na vida pessoal e comunitária,
pertence-nos despertar na sociedade actual o espanto, a admiração e o encanto
que o encontro e acção de Jesus Cristo provoca na pessoa que a Ele se abre e se
deixa transformar por Ele.
Faz parte do processo evangelizador provocar o
fascínio e alegria pela obra maravilhosa de Jesus Cristo.
A proclamação e o testemunho do amor infinito de Deus
revelado em Jesus Cristo, presente na vida da comunidade cristã, terão de ser
vividos de tal modo que suscitem os sentimentos que são descritos naqueles que
na primeira hora presenciaram os gestos salvadores do Senhor.
Este próximo ano está marcado pelo convite do Santo
Padre ao aprofundamento e vivência coerente da Fé cristã.
Como o próprio Papa afirma, no contexto da celebração
dos cinquenta anos da abertura do Concilio Vaticano II, após vinte e cinco anos
da publicação do Catecismo da Igreja Católica e, posteriormente, do seu
Compendio, reconhecendo a erosão que se tem provocado na fé cristã, através de
uma cultura demolidora dos conteúdos cristãos da existência humana, pelo
afrouxamento da evangelização e da catequese, e pelo afastamento progressivo do
homem contemporâneo em relação à Igreja, urge um conhecimento e experiência
cristãs bem fundamentadas na realidade de Deus Revelado em Jesus Cristo, tal
como a Igreja O apresenta na Escritura Sagrada,
nos Documentos Conciliares,
no Catecismo
e na vida concreta da comunidade cristã.
É este itinerário que iniciaremos como comunidade
diocesana e em festa no próximo dia 4 de Novembro, nesta mesma Igreja Catedral
e que depois se concretizará num conjunto de actividades paroquiais e
vicariais, nomeadamente nas Jornadas Vicariais da Fé.
A terminar estas minhas reflexões convido-vos a vós
que tendes responsabilidades na vida pastoral da Igreja diocesana, a
reconhecerdes, a partir da celebração que nos reúne nesta Igreja Mãe, a
exigência da Comunhão eclesial, que tem a sua fonte em Deus, Mistério de
Comunhão e de relação divina, do Pai, do Filho e do Espírito Santo, e toma a
sua expressão na Igreja que somos, na Diocese e em cada comunidade paroquial,
no modo como vivemos e refazemos constantemente a comunhão entre nós, no
diálogo, no perdão, na partilha fraterna. A Comunhão eclesial é um dom mas é
também uma tarefa constante que exige uma atenção cuidada de todos os cristãos.
Em estreita relação com a Comunhão está o empenho na
missão da Igreja diocesana. Convido-vos a abrirdes o vosso coração, a vossa
inteligência e a fortalecer a vontade para aceitardes em compromisso festivo a
tarefa que o Senhor vos encarrega de realizardes ao longo deste ano pastoral.
O nosso Bispo conta com todos nós para que este ano,
centrado no mais essencial da nossa condição de cristãos, a Fé, seja vivido em
profundidade e, através das diversas acções que vão decorrer, possa atingir
todos os diocesanos.
Imploro de Nossa Senhora, Santa Maria, Mãe de Deus,
que vos abençoe e que nos encaminhe pela evangelização do mundo de hoje.
Amen
+ João Lavrador, Bispo
Auxiliar do Porto
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